"Gêneros em crise" para Arnaldo Antunes
Estava eu aqui começando o dia, quando recebo um email da professora e amiga Najara Pinheiro. Trecho de uma entrevista com Arnaldo Antunes feita pelo Itau Cultural ("dentro da placenta do planeta azulzinho"). Pronto. Mudei o ritmo do trabalho e resolvi que trabalharia na entrevista, por que, na verdade, é uma interessante discussão sobre gêneros.
Então, faço alguns comentarios sobre respostas de Arnaldo Antunes, em homenagem a Najara e a Marcia Benetti, de quem logo lembrei, pois atualmente tem pensado sobre uma parte deste assunto.
A entrevista foca no processo criativo de Arnaldo Antunes, que, sabemos, é musico, poeta, compositor, artista visual. Do meio para o final, artista e entrevistador (Marco Aurélio Fiochi) começam a falar sobre edição, midia, gêneros.
A 4a resposta, sobre os limites entre criação e edição, tem um trecho pontual sobre produção-midia-gênero, assunto que sempre voltamos aqui:
" (...) Transformo em matéria os rascunhos, os pensamentos. Tenho de escrever, olhar, cotejar. Os meios digitais são muito adequados a esse pensamento mais fragmentário. Quando faço uma arte-final, posso experimentar várias versões, salvar, imprimir, rascunhar, mudar a ordem das partes. Eu penso materialmente, penso olhando a obra. Trabalho tanto por adição, ao criar informações, como por subtração, ao eliminar sobras até chegar ao que realmente interessa. (...)"
Concordo. E estenderia essa relação para os objetos e para a produção (extensão ao que so 'pensamento'). Existem tipos de eventos, acontecimentos, fatos que se adequam mais ou menos a uma midia ou outra, pela caracteristica semiologica desta. Assim como existem gêneros mais ou menos adequados a uma ou outra midia, ja dizia o professor Luis Marcuschi. Mais claramente, sabemos, a produção se organiza segundo a midia e vice-versa (McLuhan). Poderiamos parafrasea-lo dizendo: "O jornalista produz a matéria, pensando o tipo de composição".
Na 6a questão, o artista se analisa 'genericamente'. A despeito de vivermos um momento que lembra o Picasso do inicio do século XX, o ja ha muito multi-Antunes analisa mais profundamente o que define como "crise de gêneros":
"Talvez haja uma crise dos gêneros, que acaba resultando em uma crise de linguagens. Claro que essas denominações são funcionais. Vai-se ao cinema para assistir a um filme do Spielberg, do Godard ou a um documentário. Cada um deles tem uma linguagem diferente, mas são denominados cinema porque existe uma maneira de as pessoas se comportarem naquele lugar. Casos como esse mostram que as linguagens precisam de certa compartimentação. Mas isso não significa que não haja cada vez mais liberdade de namoro entre elas. A divisão existe até para determinar como exibir a obra. Essa questão se apresentou quando lancei Nome. Na época, houve uma dúvida se o melhor lugar para esse produto seria a loja de disco, a locadora de vídeo ou a livraria... Era um produto de difícil compreensão."
De forma pratica, Antunes explica a função da divisão em gêneros. Mercadologicamente falando, como existiriam as agências de noticias sem os gêneros? Muito ja se disse sobre as funções praticas dos gêneros jornalisticos, tanto no mercado da industria jornalistica, quanto no mercado acadêmico. Inclusive, acredito que é imprescindivel marcar essa palavra "jornalistico".
A questão se torna mais profunda se falamos de poder. Do poder que os gêneros doam a quem assina. Sem perder de vista, sempre, o campo social.
E, ainda mais profunda, se tratamos do conceito acadêmico de gênero, dentro do campo do jornalismo.
Dai, eu citaria um trecho da ultima resposta do artista:
" (...) Falamos de fronteiras entre gêneros, linguagens, mas há também fronteiras entre repertórios, entre o popular e o culto, o sofisticado e a cultura de massa. A arte põe em xeque todas elas. Em termos de circulação de informação artisticamente expressiva, eu acho que estamos em um território de liberdade, que possibilita o convívio com a diferença, o enriquecimento por meio de informações novas, de outros povos. (...)"
O jornalismo, definitivamente, não é territorio de liberdades. Entretanto, vive, como outras areas, essa crise. Uma crise que, acho eu, tem trazido interessantes soluções para o fazer jornalistico. Uma crise, para a qual os franceses estão atentos e que o Jean-Michel Utard chama de "embaralhamento dos gêneros".
5 comentários:
Lia, amiga que fiz pelo olhar *genérico*. Ler o texto e pensar em ti foi ato imediato. Em ti e em outros que sei andarilham por essas trilhas.
Maravilhoso ler tua tradução sobre a entrevista.
Sabia que renderia palavras!!!!
beijo
q dupla, najara e lia
eu sabia....
rsssss
Obrigada, Najara!
Um dia desses, como disse, vamos publicar um livro de trocas por mail...
Graci,
ta vendo o que vc fez?
Ah, Graci, é outra com a qual a ligação foi pelas palavras até que virou de pele e continua...
Com certeza sai um livro e Graci faz a apresentação!!!
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